segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Carta do Capitão de Bombeiros de Maceió

Carta do Capitão de Bombeiros de Maceió

Por: Gilberto Wiesel

(transcrita na íntegra sem correções)

Jamais poderei explicar a sensação de ser acordado a qualquer hora, tempo ou qualquer local, para cumprir o meu juramento, o meu dever, e pedir para Deus que se eu venha morrer que seja salvando uma vida.

Jamais poderei entender, por que tenho que passar nesses sete anos de profissão, pela frustração de não conseguir explicar aos meus homens o motivo pelo qual, de um investimento de dez milhões de reais em viaturas, não virá nada para o corpo de bombeiros.

Jamais poderei explicar aos meus soldados, por que num incêndio, ele deve revesar o capacete e respirar fumaça, ao invés de ter seu próprio equipamento de segurança, e que quando passar mal e tiver que ser atendido no hospital, com corredores lotados, onde só o que é belo é a propaganda paga pela SECOM as empresas, e que com certeza pagaria os equipamentos aos bombeiros.

Jamais poderei explicar aos meus homens, os motivos pelo qual, em uma noite de futebol, onde a milionária CBF apresenta seus milionários craques, o estádio rei Pelé passa pela reforma de quinhentos mil reais, para um dia de apresentação, enquanto o sargento Everaldo, começa a enfrentar um câncer de pele adquirido nos últimos 29 anos salvando vidas na praia, e sabendo que com menos de quinhentos reais, eu construiria postos cobertos e protejo aqueles que se orgulham de enfrentar a natureza para salvar vidas.

Jamais poderei explicar aos meus homens, por que de um caminhão de incêndio de quatrocentos e cinqüenta mil reais, pago pelo povo, tem que abastecer a caixa de água do palácio, enquanto num caminhão de 10.000 litros de água potável, custaria para os cofres públicos, míseros sessenta reais.

Jamais poderei explicar aos meus homens, que não posso transmitir para o mundo isso que escrevo, e o sentimento deles e de todo o corpo de bombeiros, porque serei preso por pensar na segurança da comunidade, sem ter cometido crime algum.

Agora, poderei com certeza explicar para os meus homens, que a população não tem culpa disso, e que se orgulham deles, e que seus filhos aumentam o brilho nos olhos ao falar para os colegas que seu pai é bombeiro. Que visitas como aquele garoto de 14 anos, que vive em uma cadeira de rodas adaptada, disse para o comandante geral, que queria ser bombeiro e porque Deus podia tudo ele queria salvar vidas. São tudo aquilo que eles precisam para seguir em frente, e que essa politicagem e poder jamais nos contaminarão porque optaremos por ficar pobres, mas limpinhos.

Obrigado por lerem o desabafo e autorizo comentários, porque dez dias de prisão são dez dias de serviço fazendo o que mais amo.

Nenhum comentário: