quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Sem preparo e mal paga

Sem preparo e mal paga


Do JC dia 06/08/08

“Já me controlei para não roubar”. Faltava essa confissão para uma última pincelada no quadro que mostra a que ponto chegou uma instituição que escreveu alguns dos capítulos mais importantes da história de Pernambuco, a Polícia Militar. A confissão nos remete, também, a algumas lições e a primeira delas é que não há como ter um Estado organizado em poderes, instituições, autoridades, burocracia e regulamentos sem uma corporação de homens armados e treinados para, em nome da lei, manter a ordem. Quando essa corporação se vê contaminada pelo despreparo, pelo abuso de poder e pelo banditismo, a ordem estará comprometida e a sociedade ameaçada.

Pernambuco não está solitário nessa condição, mas foi neste JC, na reportagem sobre nossa Polícia Militar, publicada no dia 27 de julho, que um membro da corporação fez essa confissão definitiva para uma reavaliação completa de toda a estrutura. Na mesma função há 22 anos, com salário de R$ 1.040, faz um “bico” para ganhar mais R$ 200. Com essa remuneração tem que cumprir as obrigações de um chefe de família. Daí a confissão completa: “Não tem quem trabalhe bem sem dinheiro para pagar as contas. Na rua, recebemos tentativa de suborno. Isso é uma forma de roubo. Já me controlei para não roubar”.

Essa é a síntese da falência anunciada de uma instituição que não pode falir. Que deve ter equipamentos modernos para enfrentar o banditismo, sim, mas que antes disso deve dar as condições mínimas de sobrevivência a quem está ungido pelo poder de Estado, com direito de usar armas na forma da lei, de fazer prisões, de impedir desordens, agressões, assaltos. De garantir a segurança da sociedade, enfim. E, no entanto, se falta a esse agente público a segurança para sobreviver, se faltam as condições materiais para garantir moradia, educação e saúde para a família, como se exigir que cumpra sua missão como a sociedade espera?

A dramática condição de despreparo do PM completa o quadro e fragiliza sua tarefa. Sujeito como está à execração pública sempre que há um erro no confronto com os bandidos, quando confunde o cidadão cumpridor de suas obrigações com o marginal, sempre que isso acontece não é apenas o agente que errou, mas toda a corporação que fica sob os holofotes. E ninguém até hoje foi capaz de condenar e mostrar o que pode a sociedade colocar no lugar da PM. Como enfrentar o banditismo sem esse corpo de agentes públicos?

Se não há resposta para essa questão, resta esperar que o poder público repense sua PM. Não dá para direcionar todo o orçamento para fazer dessa corporação uma instituição-modelo em relação ao resto do mundo, mas é necessário dizer para o que ela se destina. Seguramente não dá para esperar da corporação 100% de aproveitamento quando lhe são negadas as condições para que cada agente possa contribuir nessa tarefa. Como exigir tudo de um profissional mal pago e despreparado, quando a remuneração e o treinamento são pressupostos de um bom desempenho da função?

Não é de hoje que se alerta para esta profunda contradição: um agente público responsável pela segurança da população não pode viver no mesmo espaço de miséria a que estão condenados os alvos principais de sua atuação. Não pode um policial militar morar, com sua família, ao lado de bandidos, porque será sempre refém. E como, em nosso caso, se exigir que um servidor com remuneração de pouco mais de R$ 1 mil possa alugar uma casa em bairros de menor risco, de forma a sair de casa com a certeza de que deixou segurança para esposa e filhos?

Essa contradição ainda não foi respondida e, no entanto, poderia ser a partida para uma política diferenciada para os policiais. É lógico tratar desigualmente os desiguais. Um agente público autorizado a andar armado não pode ser igualado a qualquer outro. E se deve haver boa política de remuneração e treinamento para todos os servidores públicos, mais ainda deverá ser em relação ao policial militar, do qual se exigirá sempre o máximo na defesa da paz social, e sobre o qual deverá pesar, também, o rigor da lei no descumprimento de sua função. Por exemplo, não pode sair por aí dando tiro e matando inocentes, como está acontecendo.

Fonte: http://jc.uol.com.br/jornal/2008/08/06/can_64.php

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Pois é amigos e ainda temos que ficar calados, e dizer que está tudo lindo maravilhos e o contador de homicidio rodando a toda velocidade....

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